Quem quer ser um milionário ?

Posted: quarta-feira, 29 de julho de 2009 by Marcelo Augusto in
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Ficha : Quem quer ser um milionário ?



Fotografia: Anthony Dod
Música Tema: Jai Ho

Prêmios:

Oscar de Melhor Filme 2008


Oscar de Melhor Roteiro Adaptado 2008
Oscar de Melhor Edição
Oscar de Melhor Fotografia
Oscar de Melhor Trilha Sonora
Oscar de Melhor Canção Original
Oscar de Melhor Som
Oscar de Melhor Diretor

Jamal K. Malik (Dev Patel) é um jovem que trabalha servindo chá em uma empresa de telemarketing. Sua infância foi difícil, tendo que fugir da miséria e violência para conseguir chegar ao emprego atual. Um dia ele se inscreve no popular programa de TV "Quem Quer Ser um Milionário?". Inicialmente desacreditado, ele encontra em fatos de sua vida as respostas das perguntas feitas.


Até uns meses atrás, o cinema indiano se resumia ao mundo ocidental em três palavras-chaves: Bollywood, M. Night Shyamalan e Mira Nair. Isso até o Danny Boyle se entediar da sua terrinha nebulosa e levar sua câmera ágil para a Índia, onde rumou para rodar um filme. Realizador descompromissado, abraçou um projeto trivial: adaptar às telas o best-seller indiano “Q & A”, de Vikas Swarup - batizado posteriormente de Slumdog Millionaire (e por aqui Quem Quer Ser Um Milionário?). Detalhe: ele teria que fazer isso com um orçamento modesto – pouco mais de U$ 15 milhões -, e contar com elenco formado por atores locais. Ou seja, uma co-produção longe de ser ambiciosa…

Terminadas as filmagens, Quem Quer Ser Um Milionário? foi para a edição e chegou silenciosamente às salas de cinemas americanas no fim de agosto. Passados seis meses do lançamento o
ficial, a pergunta é inevitável: como um filme realizado na Índia com atores indianos e dirigido por um cineasta pouco convencional como Boyle faturou cerca de US$ 80 milhões, saiu consagrado nos principais festivais de cinema ganhando inclusive o Oscar de melhor filme? Mas o sucesso do “vira-lata milionário” se deve por muitas razões.

Uma das principais delas: Danny Boyle. Se antes o britânico podia ser rotulado como “o cara que dirigiu Trainspotting e alcançou sucesso comercial com Extermínio” agora a coisa muda de figura. Um de seus méritos em Quem Quer Ser Um Milionário? foi adaptar um conto de fadas urbano, aliando a pirotecnia eletrizante dos trabalhos anteriores com a estética bollywoodiana. Em menores palavras: ele
consegue contar uma história simples de maneira surpreendente.

O filme começa com uma interrogação:
Jamal Malik está a uma pergunta de ganhar 20 milhões de rúpias. Como ele conseguiu?

. Ele trapeceou.
. Ele teve sorte.
. Ele é um gênio.
. Está escrito.

Com um recurso narrativo simples, Boyle arma a bomba que irá acionar lá no fim do filme. Mas até lá, o espectador ficará vidrado.

Na cena seguinte, descobrimos que Jamal é um menino pobre e sem estudo, de apenas 18 anos. Seu bom desempenho no jogo soa incoerente ao apresentador do programa que pede à polícia para torturá-lo até confessar a fraude. Na delegacia, o delegado ouve a trajetória insólita do garoto que apesar da pouca idade conviveu com a pobreza, o preconceito e a criminalidade.


De origem muçulmana, Jamal cresceu sem rumo ao lado do irmão Salim, aliciado ao crime organizado, e de Latika (Freida Pinto, muito gata), o grande amor da sua vida. Foi para reencontrá-la que ele se inscreveu no “show do milhão indiano”. E foi a luta pela sobrevivência o conhecimento que proporcionou a ele acertar as perguntas.

Entre flashbacks e o tempo corrente que meneiam a vida de Jamal, a câmera de Boyle registra uma trama onde a decadente e flagelada capital Bombaim dá lugar ao desenvolvimento social e a prosperidade tecnológica. Na infância, o protagonista é visto numa favela percorrendo vielas, casebres e animais. Uma cena em particular chama a atenção: a câmera abandona Jamal e passa a acompanhar uma galinha em movimento. Se Boyle não quis homenagear Fernando Meireles pela abertura de Cidade de Deus, ele emulou a cena inconscientemente. Das duas uma.

Na vida adulta do garoto vemos o renascimento de Bombaim, que passa a se chamar Mumbai. Salpicada de arranha-céus, a cidade que enriqueceu com a informática é captada com onipotência pelo diretor. E é do alto de um prédio em construção que Jamal reencontra Salim, então braço direito do traficante mais temido da região. É com a ajuda do irmão bastardo que ele conseguirá ter acesso ao seu prêmio mais valioso.

Uma história simples, certo ? Mas não é isso que acontece em Quem quer ser um milionário ? .
O filme tem uma montagem tão surpreendente, que a sua história adquire um alcance social imprescendível. Slumdog Millionaire simplesmente encanta. A sua estrutura cronologica não é linear, mas foge do cansativo esquema circular que vários diretores academicos vem adquirindo tão incessantemente. Slumdog aborda um tema dentro de outro.


Podemos notar que existem duas histórias tangíveis entre si que tornam esse filme algo realmente original. A primeira história relata a vida de um jovem indiano que não teve quase nenhuma oportunidade em sua vida e que esta a beira do abismo de sua perdição, e a outra história relata os conflitos culturais e sociais que a India apresenta e o seus impactos na vida indiana.

A crítica social, no entanto, n
ão é o foco do filme. Ela é apenas uma força direcional dentro do filme, que move Jamal para os momentos emocionantes de sua vida. O filme focaliza muito mais o personagem e a força que ele apresenta ao não se deixar perder pelos desafios da vida e ainda por cima focaliza o seu esforço para encontrar aquilo que o mais fez feliz na sua vida: Latika, a menina que conheceu durante o período que estava vivendo com um dos maiores traficantes das redodenzas. Jamal passa por momentos muito dificeis na sua vida, ao lado de seu não tão digno irmão, Salim.

Em cada relação entre os personagens do filme, podemos extrair alguma intenção. Podemos ver dois irmãos com a mesma história díficil, que optam por
diferentes caminhos na vida: o Salim, que se corrompe e age na criminalidade por ser o meio mais acessível de viver, e Jamal, o personagem principal, que não se corrompe e sobrevive a todas as dificuldades da sua vida. E é justamente nesse ponto que reside a verdadeira audácia do filme: a abordagem de uma força maior, chamada destino. Ao decorrer da trama, o rapaz vai acertando as perguntas do reality show do milhão indiano, e as explicações para esses acertos inimagináveis, são explicadas de acordo em que a história de Jamal é vivida, onde o destino entrelaçou momentos únicos de sua vida ao momento em que ele se tornaria um milionário.

Jamal e seu irmão, são forçados a lidarem com problemas sociais, e as consequencias desse confronto resultam cada vez mais no afastamento entre eles. Jamal também precisa enfrentar problemas que o separam cada vez mais de sua amada, Latika. Enquanto suas vidas vão sofrendo cada vez mais com as dificuldades, vemos um personagem determinado a lutar co
ntra tudo isso. Jamal nunca desiste de acreditar em seu irmão e nunca abandonou seu amor Latika. E para alcançar o que tanto quer, que é reencontrar seu verdadeiro amor, ainda preso forçadamente a mesma vida indigna que seu irmão vive, Jamal opta pela ousadia: entrar em um programa que o colocasse ao vivo na televisão.

Uma das cenas mais bem feitas do filme, é o momento em que Jamal encontra Arvind, um garotinho que fora cego inescrupulosamente para ganhar mais ao mendigar nas ruas e entregar o dinheiro ao traficante que o mantinha vivo, o alimentando e dando-lhe aonde dormir. Nesse reecontro, vemos a idéia central do filme sendo enfatizada, quando o desafortunado Arvind diz a Jamal que as pessoas estão fadadas a serem sortudas ou azaradas, e que eles haviam seguido por caminhos opostos: Arvind seguira na pobreza cega e Jamal seguira para o brilho no futuro. Com essa cena, vemos que o destino encarrega as situações de acontecerem e que as pessoas precisam persistir para que o destino seja cumprido. Ainda nesse momento do filme, descobrimos como Jamal sabia uma das perguntas feita a ele no programa.


Convem ser dito, que o filme não seria mesmo, se não fosse a técnica e o feeling que os atores e os produtores tiveram ao fazer o filme. A montagem fotográfica é inacreditável. Técnicas inovadoras de filmagem são aplicadas no filme, o tornando extremamente dinamico e intenso. A trilha sonora é extremamente oriental, mas não o oriental tradicional, mas o oriental jovem, o pop oriental. As músicas acompanham o ritmo frenetico dos acontecimentos e acompanha o dinamismo das filmage
ns. Slumdog não brilha apenas por um aspecto, mas brilha pelo conjunto da obra.

Um dos principais fatores que explica esse fenômemo de filmagem é a atuação de quase todos os atores no filme, especialmente os mirins. Slumdog é contado através de três períodos: a infância, a adolescência e a vida adulta. Os interpretes mirins interpretaram aquilo que realmente são: pobres crianças que vivem na favela. E acreditem, elas carregaram o filme.


Azharuddin Mohammed Ismail é a estrela mirim do filme. A técnica desse rapazinho pobre é surpreendente. Ele deu um banho em inumeros americanos artistas. É graças a suas maldades que passamos a entender melhor a idéia do filme e o que viria pela frente. As crianças do filme te prendem a história, mesmo quando elas não participam mais. Elas são a chave para que possamos gostar do filme. Todas elas fizeram cenas dificeis, trágicas. O filme deve seu sucesso á elas.

Quanto a estrela adulta do filme, pode-se dizer que não houve um destaque, e sim uma obra em conjunto.
Freida Pinto, Dev Patel, Madhur Mittal fizeram talvez a melhor apresentação de suas vidas. Sem contar que, Freida e Dev alavancaram suas carreiras. O rapaz já esta gravando um filme de M. Night e ela, logo estreiará um filme americano. Os dois, por serem jovens, tem um futuro promissor, e Slumdog foi a porta desse sucesso.

Slumdog Millionaire não apresenta uma história fantástica. No entanto, o carinho pelo qual foi feito, o tornou em um merecedor da estatueta de melh
or filme. Apesar de ter algunsa clichês, como o final romântico e cenas exageradas, o filme é sim, original. Confira essa preciosidade.


Curiosidades:

. Os cachês dos três atores mirins que protagonizam o filme foram depositados em um fundo, para que sejam apenas retirados quando completarem 16 anos. Além disto os produtores se responsabilizaram pela contratação de um motorista que os levará ao colégio todos os dias até que cheguem à mesma idade.

. Cerca de 20% dos diálogos do filme são em hindi.

. A trilha sonora foi composta por A.R. Rahman em apenas 20 dias.









Crash - No limite da Vida

Posted: terça-feira, 28 de julho de 2009 by Marcelo Augusto in
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Ficha : Crash – No limite da Vida



Fotografia: James Muro
Música Tema: Maybe Tomorrow

Prêmios:
Oscar de Melhor Filme 2006
Oscar de Melhor Roteiro Original 2006
Oscar de Melhor Edição 2006

O filme mostr
a o encontro de vários personagens totalmente diferentes nas ruas de Los Angeles: uma dona-de-casa e seu marido, promotor público, da alta sociedade; um lojista persa; um casal de detetives da polícia - ele afro-americano, ela latina -, que também são amantes; um diretor de televisão afro-americano e sua esposa; um mexicano especialista em chaves; dois ladrões de carros da periferia; um policial novato; e um casal coreano de meia-idade. Todos vivem em Los Angeles e cada um tem sua própria história. Nas próximas 36 horas, eles vão se encontrar.

Crash – No limite
da Vida é um filme intangível. O seu desenrolo cinematográfico revela quão precioso um bom roteiro pode ser e o quão perfeito o cinema é, ao ser vinculado com questões sociais da atualidade. A sua história, por ser simples, revela também a capacidade de transmitir uma mensagem de forma certeira e precisa. A sagacidade dos personagens possui uma forma de atingir psicologicamente as pessoas que assistem Crash. A parte técnica do filme é impecável e sua abrangência específica é inquestionável. Parece paradoxo em se citar abragência específica, no entanto, a conexão entre a simplicidade dos fatos, o descompromisso com uma história retilínea e o alcance que os personagens apresentam, revela certeiramente o preconceito, assunto abordado no filme. O filme é abrangente por se tratar de tantos tipos sociais, que justamente por isso e por uma seqüência de coincidências, fazem com que o filme, aparentemente uma história retilínea, se torne um filme circular e intenso. O encaixe entre essa simplicidade abordada, a profundidade dos personagens e a técnica incomparável do filme colocam Crash como um dos melhores filmes da atualidade do cinema. O filme faz jus a sua frase de efeito: Até onde você se conhece?

O filme nos faz acompanhar a capacidade que cada pessoa tem ao ter que lidar com situações inusitadas, onde o preconceito embutido se torna vivo e presente. As pessoas descobrem quão preconceituosas são ao terem de lidar com abismos diferentes e opostos: a infelicidade ou a amargura
da vida e o medo do negro, do estrangeiro, do diferente. As personagens são levadas para o fundo desse abismo, onde descobrem quão fracas são, e o quanto elas não se conhecem realmente. O confronto entre o medo, a fúria, o abandono, as condições de vida, a violência e a intolerância se misturam nesse show de filmagem. Os atores nunca trabalharam tão espetacularmente como trabalharam em Crash. Crash não é apenas um filme: é um retrato da existência humana.

A questão
do racismo é complexa e sua abordagem no filme pode soar agressiva em primeira instância, mas é analisada com um realismo e coragem impressionantes, somando mais pontos a Crash – No Limite , seja junto aos negros americanos, como os latinos ou árabes - principalmente após os fatos acontecidos após 11 de setembro. O preconceito acaba sendo um tema incessantemente abordado durante toda a película, que marca a estréia do canadense Paul Haggis – roteirista do premiado Menina de Ouro (2004) – na direção. Haggis trabalha com esperteza a insegurança o olhar superficial que se tem ao viver em uma metrópole como Los Angeles.

A história, escrita pelo diretor em parceria com Bobby Moresco, não mostra um retrato maniqueísta da realidade. Não há culpados, nem vítimas: todos estão à mercê do medo e da imprevisibilidade. O cineasta usa a superficialidade das relações na era moderna para despejar personagens em
busca de sentidos e emoções, nem que para isso seja preciso um violento esbarrão no trânsito.


A narrativa começa em um desses acidentes de trânsito. A partir daí, são mostradas as 36 horas que antecedem o momento da tragédia.Entram no contexto do enredo Jea(Sandra Bullock)uma dona de casa egocêntrica, e seu marido Rick (Brandan Fraser), um influente promotor público;Gr
aham (Don Cheadle)Ria (Jennifer Esposito , um casal de detetives avessos à corrupção; o renomado diretor de televisão Cameron (Terrance Howard)e Christine (Thandie Newton), sua esposa; Daniel (Michael Pena), um chaveiro mexicano; Farhad (Shaun Toub, um lojista persa desmiolado; Peter (Larenz Tate, Anthony (Chris “Ludracris” Bridges), dois ladrões de carros da periferia; e Tom Hansen (Ryan Phillippe), um policial novato aprendendo as lições da rua com Ryan (Matt Dillon).

Suas histórias são entrelaçadas em uma montagem flexível e empolgante. A atuação do elenco é excelente, representando convincentemente os papéis difíceis reservados, desde os atores menos conhecidos até os medalhões como Sandra Bullock, Brendan Fraser, Matt Dillon, Ryan Phillippe e Don Cheadle. Afinal, não são apresentados protagonistas. Todos os personagens são obrigados a integrar e interpretar o balaio da discórdia. Um brilhante debut de Paul Haggis, fazendo muito com pouco orçamento (US$ 6,5 milhões), Crash - No Limite entra seguramente, e com folga, na lista de melhores filmes de 2005.